Dia 1 (Carvalhos - Albergaria)


Tal como nas nossas previsões, até porque o esforço do dia anterior tinha sido brando, acordámos cheios de energia! Chegamos às 7h em ponto ao local onde tínhamos ficado na véspera (os meus sogros deixaram-nos lá) e estava um nevoeiro cerradíssimo, de modo que fomos obrigados a vestir o colete – novo instante de comoção. As lágrimas ainda vieram espreitar os primeiros raios de sol, mas contive-me porque tinha dito a mim própria que guardaria todas as minhas lágrimas para o momento de chegada. Mas, à semelhança da noiva que só sente que o é quando põe o véu na cabeça, também eu só me senti verdadeiramente uma peregrina quando vesti o colete reflector amarelo fluorescente com a sigla GCF inscrita na parte de trás, tamanho XXL!!! O controlo da situação não foi fácil, mas assegurei-me de que aconteceria e passados uns minutos estava recomposta.

"Em homenagem a este grupo que
tanto apoio nos tem dado, olhem lá
o que dizem os nossos coletes..."
De qualquer modo este primeiro dia foi, seguramente, o mais fácil de todos. Com os pés impecáveis, a única coisa que nos fazia parar era o calor, a sede, a desorientação e a fome! Logo em Santa Maria da Feira, optámos por abandonar a EN1 para apanhar a Estrada Romana, o que nos permitiu, além de eliminar alguns quilómetros, respirar um ar mais puro e caminhar por estradas bem mais seguras e desocupadas. Além disso, foi frequente, sempre que nos desviávamos da estrada nacional, cruzarmo-nos com peregrinos de Santiago. Uns a pé, com pesadas mochilas às costas, outros de bicicleta, com idades que deviam chegar aos 70 anos, de vários países, alguns já com milhares de Km de peregrinação, mas todos com o mesmo denominador comum: um sorriso que abriam de orelha a orelha que nos enchia a alma e ao qual respondíamos com um aceno que traduzia uma vontade orgulhosa de dizer bem alto “nós também vamos em peregrinação”!!!

"Os Sogros na box à nossa espera para (mais) uma garrafinha de água!"



Neste primeiro dia fomos também brindados pelo grande elo de ligação entre mim e o meu marido: as obras! É verdade! Esta caminhada esteve sempre carregada de simbolismo e, por este motivo, o nosso primeiro grande obstáculo foi atravessar um obra no IC2 em Santa Maria da Feira. Apesar do troço estar interdito a peões, a nossa convicção (ou será teimosia?) não nos parou, de modo que quase fomos parados pela equipa de higiene e segurança da obra. A verdade é que, de colete reflector vestido, a nossa presença passaria totalmente despercebida não fossem os nossos bonés (a substituir os capacetes) e as minhas calças cor-de-rosa choque. E quando achamos que andar no meio dos dumpers, com lama a dar-nos pela cintura, era um pouco de mais, resolvemos passar para a alternativa: caminhar pelo lado exterior dos rails de protecção da estrada (que agora não tinha berma por causa das obras), com um talude inclinadíssimo a uma altura brutal. Enfim! Prova superada com o prémio - o almoço - a aproximar-se cada vez mais.

"Esta é para a família Varela (saída da EN1 para a terrinha do pai)."




E eis que encontramos o "restaurante" - 3 estrelas Michelin, diga-se de passagem, com direito a dormida e a tudo a que tínhamos direito!!!


"Depois do soninho de beleza!"


"O GCF está a ganhar coragem para retomar a caminhada... O cansaço já se faz sentir um pouco e o calor também. Esta manhã rendeu-nos quase 5h e 24,3Km. Será que vamos chegar ao nosso objectivo dos 40Km?"

E a resposta a esta questão que deixamos no facebook teve como resposta... NÃO!!! Nunca conseguimos fazer 40Km por dia. Para já não precisávamos e depois porque acabávamos por nos deixar vencer pelo cansaço. De qualquer maneira ficamos sempre muito perto. Neste dia se calhar até fizemos mais, porque andámos a "passear" pelo centro de Oliveira de Azemeis. Seguindo as famosas setas azuis, a páginas tantas deixamos de as ver (ou porque deixaram de existir ou porque nos escapou alguma) e pudemos apreciar a rotina desta bela cidade... (os nossos pezinhos que o confirmem)

"Confirmo que roubaram o menino mijão do centro de O. Azeméis."



Depois de pedirmos indicações e de nos mandarem quase ao Porto dar a volta para apanhar a EN1 (estou a exagerar, como é evidente), resolvemos consolidar a nossa convicção (vulgo, teimosia) e fazer exactamente o oposto. E não correu mal! Mais meia hora, menos meia hora, mais 3 Km, menos 3 Km e lá demos por outra seta azul que nos mandou por um caminho bem lindo mas que desorientou completamente os meus sogros, de modo que andamos a tarde quase toda sozinhos. Mas valeu a pena porque quando os encontrámos tínhamos o lanche pronto, com a respectiva tenda montada em frente a uma bomba de gasolina, em plena EN1. E só posso dizer uma coisa: nunca um pãozinho com fiambre me soube tão bem como naquele dia!

Mais uma horinha de caminhada, desta vez acompanhados pela minha sogra para reforçar a energia do lanche e chegámos ao destino agendado!

Neste dia optámos por ir dormir a nossa casa para repor as energias no nosso ninho. E depois do ritual dos banhos, cremes, emersões e comidinha, tivemos o merecido descanso do herói. É que, com tanto esforço, receávamos no dia seguinte não ter força para, sequer, abrir as pestaninhas...

"No final deste primeiro dia (antes dos alongamentos)."



"Amiguíssimos, se a manhã foi muito produtiva, a tarde nem por isso. Peregrinámos, peregrinámos e peregrinámos, mas parecia que não saíamos do sítio. No total, segundo o que apuramos pelo mapa, fizemos 38km durante todo o dia, mas na nossa opinião fizemos mais. Para começar, quisemos fazer percursos alternativos pelo meio do monte que não aparecem neste mapa (os camiões fazem muito barulho e o contacto com a natureza e com os peregrinos de Santiago de Compostela é bem mais aprazível). Os caminhos estão sinalizados por setas azuis, mas, a páginas tantas, deixamos de as ver... Quando demos por nós, andávamos a ver as montras de Oliveira de Azeméis. Ainda assim, ficámos bem perto do nosso objectivo. Para a memória ficam as passagens pelo meio das obras que interromperam a passagem na EN1 na Feira, a quantidade de animais mortos na beira da estrada cilindrados, o que lhes conferiu a espessura de um pão pita, a velocidade monstruosa a que os veículos circulam e o gosto que os seus condutores têm em nos dar sustos, o andar no meio do mato, o caminhar sob o sol a pique, em subidas intermináveis, enfim! Só boas recordações destas "férias" :D Graças a Deus que tenho uns sogros de categoria que a cada 500m nos aguardam com uma garrafinha de água (o maridão acabou com a cerveja ao almoço) e uma palavrinha de apoio e que no final do dia nos trouxeram de volta ao nosso castelo. Banhinho de hidromassagem tomado, corpo hidratado, creme para pernas cansadas que de tão fresco deixaram o esposo mal-disposto (isto faz-me lembrar a I.C.), roupa a lavar, roupa a apanhar, mala feita para os próximos 4 dias, pés em salmoura e estamos prontos para mais um dia de caminhada. Agora só voltamos a casa no fim! Nem imagino o que será acordar amanhã, mas depois conto-vos... :) Beijos GRANDES!!!"

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